geJornalistas de todo Brasil foram surpreendidos hoje, 21, com a notícia do Procurador da República Wellington Divino Marques de Oliveira de que o jornalista Glenn Greenwald, co-fundador do site The Intercept Brasil foi denunciado juntamente com hackers que teriam, supostamente conseguido acessar remotamente mensagens de autoridades públicas, em conversas pouco republicanas sobre diversos temas.

O jornalista Glenn ganhou destaque depois de publicar em conjunto com a Folha de São Paulo e outros meios de comunicação conversas pouco republicanas em alguns casos ou bastante reveladoras em outros casos de diversas autoridades do Judiciário, Legislativo e Executivo.

Em todo mundo mensagens com esses conteúdos reveladores são publicados comumente por jornais, em países democráticos, que acabam por cooperar para a descoberta da verdade expondo tramas sórdidas e articulações que a população geralmente desconhece.

A publicação de conversas vazadas ganhou maior destaque com a operação Lava Jato que selecionou trechos de conversas e os encaminhou a alguns meios de comunicação sob o pretexto de que as pessoas deveriam saber o que se passa no meio público, entretanto, outros trechos de conversas interceptadas foram mantidas em sigilo, o que gerou críticas contundentes tanto no meio jornalístico, quanto no meio jurídico e político.

A denúncia de cerca de 95 páginas considera que Glenn poderia ter autuado como auxiliar de hackers, porque supostamente ele teria dito para um dos hackers para deletar os conteúdos repassados a ele de suas máquinas. Com isso o MPF criou uma narrativa que, a juízo do procurador, seria suficiente para incluir Glenn no polo passivo da ação penal, entretanto, a matéria é muito mais espinhosa do que parece e se relaciona com o papel dos jornalistas numa sociedade livre.

Na visão de alguns políticos os jornalistas só devem publicar o material que não os irritem, na visão outros, o jornalista não deve publicar nada que incomode as pessoas, mas o verdadeiro papel do jornalismo é informar, revelar a verdade, por isso a Constituição Federal assegura aos jornalistas e meios de comunicação a inviolabilidade ao sigilo da fonte, que aliás trata-se de clausula pétrea (imutável) contida no art. 5º, XIV da Constituição Federal que assim diz:

“XIV – é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;”

Essa garantia constitucional é o que assegura o pleno exercício profissional do jornalismo. Quando um jornalista toma conhecimento de um fato, pelos diversos meios possíveis, ele é quem analisa se deve ou não publicar a matéria, e havendo excessos responderá pelo excesso, nos termos da lei.

Entretanto, a denúncia apresentada pode abrir um precedente que inviabilizará o jornalismo livre no Brasil, já que os jornalistas se sentirão obrigados a publicarem apenas o que não desagrada políticos ou pessoas do meio jurídico.

“Ou a imprensa é livre de fato ou não há liberdade de imprensa”

Se a denúncia pegou de surpresa a maioria dos jornalistas do Brasil, ela pode pegar de surpresa procuradores do Ministério Público, pois, na recente lei  nº 13.869/2019, de abuso de autoridade, aprovada pelo Congresso e sancionada pelo Presidente Jair Bolsonaro há pelo menos dois artigos que pretendem coibir a intimidação de autoridades, resta saber se eles serão aplicados ao caso ou não.

É que os artigos 27 e 30 da Lei de Abuso de Autoridade consideram crime a investigação de infração penal, em desfavor de alguém, à falta de qualquer indício da prática de crime ou ilícito funcional ou infração administrativa, da mesma forma que considera crime dá início a persecução penal sem justa causa fundamentada contra quem sabe inocente e aí está o nó da questão.

Veja primeiro os artigos:

Art. 27.  Requisitar instauração ou instaurar procedimento investigatório de infração penal ou administrativa, em desfavor de alguém, à falta de qualquer indício da prática de crime, de ilícito funcional ou de infração administrativa:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Art. 30. Dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente: (Promulgação partes vetadas)

Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.


Portanto, a questão que se coloca a conversa do jornalista com sua fonte, no caso concreto, é suficiente para que sua conduta possa classificá-lo como partícipe e garantidor ou orientador de associação criminosa?

Parece-nos, em princípio, que não é assim.

Se todavia, Glenn demonstrar que não há embasamento ou fundamento para sua denúncia, ou seja, que falta justa causa fundamentada para que ele seja denunciado na ação penal, ele poderá exigir a aplicação da Lei de Abuso de autoridade que pode gerar uma pena de detenção para os procuradores envolvidos na denúncia de 1 a 4 anos e multa, conforme descrito no art. 30 da Lei.

É certo que Glenn incomodou poderosos dentro e fora do judiciário, mas demonstrou até aqui, que no Brasil há ou havia, até agora, garantias que dão sustentação à verdadeira atividade do jornalismo que em suma é a busca da verdade dos fatos, tal qual ocorre nos EUA, França, Alemanha, Portugal, Espanha, Canadá, Inglaterra, Argentina, Uruguai e outros tantos países.

NCZ: Notícia objetiva. A verdade vencerá a escuridão.